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terça-feira, 18 de outubro de 2011

O SUS e a Bioética no Hospital


O Sistema Único de Saúde  ( SUS) vem sendo operacionalizado e  implantado no Brasil, perante um processo organizado, norteado por alguns princípios, ora doutrinários, ora organizativos. As mudanças políticas e sociais que ocorreram, e ainda ocorrem na saúde de toda a população brasileira é um bom parâmetro para indicar como este processo é árduo e constante.

A Constituição Federal de 1988 foi o primeiro passo para mudança no cenário da saúde nacional, onde o curativismo deixou de ser o principal foco das políticas públicas. O artigo 196 da Constituição demonstra o surgimento dos preceitos da Bioética no ambiente nacional, estabelecendo que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, desenvolvendo-se assim a Lei orgânica do SUS,  dispondo-se sobre a promoção, proteção e recuperação da saúde, com os princípios de Universalidade, Integralidade e Equidade. 
De acordo com a Bioética, a saúde é um conjunto de fatores, e não somente a ausência de doenças e, é por este motivo que promover, proteger e recuperar a saúde torna-se cada vez mais difícil, principalmente no ambiente hospitalar, que traz consigo um cenário repleto de regras e condutas a se seguir, tanto para o profissional como para os clientes, mesmo porque, esta instituição está organizada no modelo de recuperação da saúde, colocando em segundo plano as outras práticas de prevenção de doenças e promoção da saúde.
Trabalhar com a universalidade, integralidade e equidade, no ambiente hospitalar pode parecer simples, mas quando nos deparamos com os verdadeiros princípios do que é saúde e como trazer todos os direitos dos usuários e profissionais para esta ótica, encontramos algumas facetas que não são fáceis de superar. O que dizer da universalidade, princípio que garante a assistência a todos os indivíduos. No meio hospitalar é visto como uma universalização não integral, mais sim segmentado, diferente do constitucional, pois está organizado para responder às demandas que lhe serão ofertadas, trazendo um direcionamento aos tratamentos que mais fornecem ações; acarretando mais rentabilidade e menos investimento para a instituição.
A universalidade é um princípio muito amplo e pode ser ofendido por pequenos atos impensado, principalmente no ambiente hospitalar, haja vista a dinâmica desta atmosfera. Quando se impede um usuário de acompanhar o seu familiar durante o processo de internação, somente pelo fato de não ter idade suficiente, estamos ferindo este princípio, porque, como a saúde é muito mais que a ausência de doenças, ao cecearmos este familiar do convívio com o seu ente, estamos gerando uma agressão à saúde do paciente e do acompanhante, que tem direito a assistência também,  garantida através da universalidade.
Outro ponto importante a se  referir no principio da universalidade é quanto a entrada dos clientes neste setor, que só serão atendidos caso seja indicado por outro órgão regulador, ferindo-se assim este princípio. Por esta razão, de alocação da demanda e outros fatores que dificultam à entrada do usuário no sistema de prestação de cuidados a saúde, sendo um obstáculo à garantia deste direito constitucional, vem se consolidando como parte de um sistema suplementar, os Planos de Saúde, exercitados por operadoras privadas, sob a regulação da Agencia Nacional de Saúde.
Na visão da integralidade, vê-se outro princípio de grande relevância para o ambiente hospitalar, que é pautado na ótica de uma assistência completa e individualizada. A integralidade da assistência é barrada no ponto em que se questiona: qual é a total assistência do serviço prestado? Nesta  visão, pensando também no cuidado específico que é fornecido no hospital, como a recuperação de uma crise de  asma, controle de uma hipertensão severa ou  um cirurgia eletiva, deparamos com uma integralidade descontínua, onde tratamos muitas vezes da doença e nos esquecemos do paciente, que necessita de um tratamento de saúde mais amplo, visando outros problemas, que para ele, podem ser muito mais importante do que o fenecer de uma moléstia.
A integralidade da assistência hospitalar deve ser vista além dos muros que cercam o hospital. A preparação para alta, algo muito falado, mas pouco trabalhado pelos profissionais, devido a outros fatores que não somente a falta de tempo, mas sim, muitas vezes pelo impasse das normas e condutas que colocam os profissionais sobre rotinas gessadas, sem a abertura para uma conversa informal ou uma orientação aos familiares, que também participam do processo saúde doença, deste indivíduo internado.
Outro foco da integralidade que é lesado na ótica de profissional para profissional e ainda é muito falho no ambiente hospitalar, é a referência e contra referência. Ferramenta importantíssima para continuidade da assistência tanto no hospital como fora dele. Podemos observar que, é pouco utilizado, seccionando a assistência hospitalar e comprometendo a integralidade do cuidado a saúde do paciente.
O desafio de gerar uma assistência de atenção a todos os indivíduos de uma população, de forma integral, cobrindo todos os problemas de saúde das diversas árias e dos mais variados motivos, é barrado no recurso financeiro, material e profissional. Para isso encontra-se o princípio da equidade, que é: “dar mais recurso para quem necessite de mais”. 
No hospital, este princípio é muito trabalhado. Diferente do que se pensa o ambiente é muito fértil para  a colocação deste princípio. Quando disponibilizamos mais horas de atenção a um indivíduo que está mais grave ou necessite de mais assistência, estamos fazendo a equidade funcionar. Outro exemplo é o CTI em relação a clinica de internação. Na clinica, trabalhamos com menos recurso tecnológicos e por este motivo, menos gastos, sendo assim, estamos provendo mais recursos para os pacientes do CTI do que da clinica de internação. Mas até que ponto isso é justo?
Para sanar este questionamento e prover uma maior fiscalização e controle das práticas de saúde dentro do SUS, surge o princípio da participação da comunidade que é nomeada de Controle Social.  A participação da comunidade aponta claramente para a formulação de um mecanismo de democratização do setor público de saúde, com repercussão direta no setor conveniado, contratado e no mercado de trabalho, forçando-os a trabalharem de acordo com as normas da sociedade.
Na atmosfera hospitalar, o controle social não é trabalhado, haja vista que o hospital é controlado por um gestor, que fiscaliza  e gerencia toda a atividade laboral desta unidade. Num olhar mais amplo, o controle social se faz presente, pois para trabalhar com SUS as unidades tem que estar em consonância aos seus preceitos, que são ditados pela comunidade.                 
Levando-se em consideração os aspectos mencionados e o cenário da saúde hospitalar, não é difícil de concluir que falta muito para se fazer no SUS e o que já esta sendo realizado necessita de reformas. A prática hospitalar é dinâmica e sofre constantes mudanças, por este motivo que devemos estar atentos as falhas, quebrando as facetas e paradigmas pautados somente no curativismo, pois o hospital também é lugar de se trabalhar a promoção  da saúde, trazendo práticas que agregam a saúde como um sistema mais amplo e não somente a ausência de doença. E que estas doenças não sejam apenas patologias, mas sim agravos a saúde de um núcleo familiar, que empenha prioridades e deveres com seus entes, necessitando de atenção e assistência.   
Alisson Mateus Freitas dos Reis, 2011.